Primeiro duas pontes, 8 pistas de entrada e 8 pistas de
saída da ilha. A antiga ponte Hercílio Luz passa por uma reforma há 100 anos,
todo o ano se comemora o aniversário de reforma da ponte, e a cada 4 anos é
plataforma política para governo do Estado de Santa Catarina. Na entrada da
cidade, pistas repletas de carros e buzinas, afinal esse é o modelo de
modernidade que sempre se buscou, fazer com que Florianópolis se transformasse
enfim na grande capital sonhada. O centro da cidade, que durante muitos anos conseguiu
resistir à especulação imobiliária, acabou sucumbindo, e hoje temos um centro
bem interessante, cheio de prédios, de escritórios, de ruas vazias à noite,
tomadas apenas pela prostituição e pelos mendigos, além dos fumadores de crack
e usuários de outras substâncias em moda na época aqui citada.
O lindo empreendimento da Ponta do Coral abriga uma pracinha
cercada por grades para uso exclusivo dos hóspedes daquele luxuoso lugar, e os
shoppings proliferam a cada dois quilômetros da Avenida Beira-Mar. Antigamente
os bairros da cidade eram separados por montes ou por vales cheios de
fazendinhas, que rapidamente se transformaram em condomínios fechados para
proteção da população desejosa de se exibir entre muros e com seguranças no
portão, mentindo a si mesmos de que essa medida é para proteger a família,
coisa que seria dever do Estado, mas já que o Estado não faz....
As antigas praias lindas e praticamente selvagens da ilha
estão afogadas entre as mudanças climáticas e as dunas, única proteção que lhes
resta. As casas chegam até o pé das dunas, e o mar avança. As faixas de areia
são praticamente inexistentes, e os poucos que se aventuram a passar umas horas
perto do mar brigam para conseguir um lugar um pouco mais confortável nas dunas
mesmo. O mar tem um cheiro estranho e tem uma camada de óleo que gruda na pele
dos corajosos. De vez em quando, não se sabe de onde, um arrastão de espuma
marrom e pedaços de fezes e outras coisas chegam até as praias entre os
banhistas, que se acostumaram a nadar no meio dos dejetos. Isso já aconteceu em
outros lugares antes, é sinal de modernidade! Grandes hotéis e condomínios
ocupam as melhores áreas, e o cheiro chega bem nos narizes daqueles que buscam
as varandas dos apartamentos...só que todos ninguém mais repara nisso. Há
muitos anos, quando a Lagoa da Conceição ainda era utilizada como lugar de
lazer, fedia na sua zona sul. Hoje em dia está interditada, tendo inclusive
sido responsável por um dos surtos de hepatite na Ilha. Afinal, esse é o preço
da modernidade.
Durante as chuvas, não há lugar para escoar a água, e os lugares
mais baixos enchem. As casas são tomadas pelas águas que descem das ladeiras
dos morros cheios de casas. A Lagoa do Peri há muito está contaminada e a Casan
terá feito uns experimentos de decantação com a UFSC para poder fornecer água potável
aos habitantes da ilha. Por enquanto, a Casan jura que a água está com
excelente qualidade, vem até comprovado nas contas, mas alguns óbitos ocorridos
registram como causa mortis: gastroenterite, cólera, hepatite e outros bichos
mais agressivos, afinal, os antibióticos já não dão conta das enfermidades
todas da modernidade...Corre uma licitação há alguns anos para se conseguir um
fornecimento vindo do continente. Os barcos não conseguem mais navegar perto da
costa devido ao acúmulo de lixo e material orgânico que se enrosca nos motores.
As ostras e os camarões nunca foram tão gordos, e a indústria exportadora é
florescente. Nunca se viu tanta merda! Peixes, impossível, a tainha desapareceu
há tempos, e também a anchova, resistindo a brava corvina.
Florianópolis perdeu suas praias, seus poucos prédios
antigos, sua “vocação” turística. Hoje em dia é a capital que o Estado de Santa
Catarina sempre sonhou: tem teatro (pouco, mas tem), cinema, e principalmente
condomínios fechados, cocô nas praias, doenças, shoppings, muitos shoppings,
algumas pessoas com muito dinheiro no bolso e o povão...bem...continua como
sempre...votando no conservadorismo brilhante. Afinal, tudo pode estar uma
merda, mas somos a capital do Estado, com cara de Capital, até que enfim!!!!!
Este é o retrato que vejo de Florianópolis no ano de 2080, escrito
no calor da hora e da decepção pelas eleições de 2012. Ainda bem que em 2080 já
não estarei neste mundo.