domingo, 7 de outubro de 2012

RETRATO DA CIDADE DE FLORIANÓPOLIS EM 2080






Primeiro duas pontes, 8 pistas de entrada e 8 pistas de saída da ilha. A antiga ponte Hercílio Luz passa por uma reforma há 100 anos, todo o ano se comemora o aniversário de reforma da ponte, e a cada 4 anos é plataforma política para governo do Estado de Santa Catarina. Na entrada da cidade, pistas repletas de carros e buzinas, afinal esse é o modelo de modernidade que sempre se buscou, fazer com que Florianópolis se transformasse enfim na grande capital sonhada. O centro da cidade, que durante muitos anos conseguiu resistir à especulação imobiliária, acabou sucumbindo, e hoje temos um centro bem interessante, cheio de prédios, de escritórios, de ruas vazias à noite, tomadas apenas pela prostituição e pelos mendigos, além dos fumadores de crack e usuários de outras substâncias em moda na época aqui citada.
O lindo empreendimento da Ponta do Coral abriga uma pracinha cercada por grades para uso exclusivo dos hóspedes daquele luxuoso lugar, e os shoppings proliferam a cada dois quilômetros da Avenida Beira-Mar. Antigamente os bairros da cidade eram separados por montes ou por vales cheios de fazendinhas, que rapidamente se transformaram em condomínios fechados para proteção da população desejosa de se exibir entre muros e com seguranças no portão, mentindo a si mesmos de que essa medida é para proteger a família, coisa que seria dever do Estado, mas já que o Estado não faz....
As antigas praias lindas e praticamente selvagens da ilha estão afogadas entre as mudanças climáticas e as dunas, única proteção que lhes resta. As casas chegam até o pé das dunas, e o mar avança. As faixas de areia são praticamente inexistentes, e os poucos que se aventuram a passar umas horas perto do mar brigam para conseguir um lugar um pouco mais confortável nas dunas mesmo. O mar tem um cheiro estranho e tem uma camada de óleo que gruda na pele dos corajosos. De vez em quando, não se sabe de onde, um arrastão de espuma marrom e pedaços de fezes e outras coisas chegam até as praias entre os banhistas, que se acostumaram a nadar no meio dos dejetos. Isso já aconteceu em outros lugares antes, é sinal de modernidade! Grandes hotéis e condomínios ocupam as melhores áreas, e o cheiro chega bem nos narizes daqueles que buscam as varandas dos apartamentos...só que todos ninguém mais repara nisso. Há muitos anos, quando a Lagoa da Conceição ainda era utilizada como lugar de lazer, fedia na sua zona sul. Hoje em dia está interditada, tendo inclusive sido responsável por um dos surtos de hepatite na Ilha. Afinal, esse é o preço da modernidade.
Durante as chuvas, não há lugar para escoar a água, e os lugares mais baixos enchem. As casas são tomadas pelas águas que descem das ladeiras dos morros cheios de casas. A Lagoa do Peri há muito está contaminada e a Casan terá feito uns experimentos de decantação com a UFSC para poder fornecer água potável aos habitantes da ilha. Por enquanto, a Casan jura que a água está com excelente qualidade, vem até comprovado nas contas, mas alguns óbitos ocorridos registram como causa mortis: gastroenterite, cólera, hepatite e outros bichos mais agressivos, afinal, os antibióticos já não dão conta das enfermidades todas da modernidade...Corre uma licitação há alguns anos para se conseguir um fornecimento vindo do continente. Os barcos não conseguem mais navegar perto da costa devido ao acúmulo de lixo e material orgânico que se enrosca nos motores. As ostras e os camarões nunca foram tão gordos, e a indústria exportadora é florescente. Nunca se viu tanta merda! Peixes, impossível, a tainha desapareceu há tempos, e também a anchova, resistindo a brava corvina.
Florianópolis perdeu suas praias, seus poucos prédios antigos, sua “vocação” turística. Hoje em dia é a capital que o Estado de Santa Catarina sempre sonhou: tem teatro (pouco, mas tem), cinema, e principalmente condomínios fechados, cocô nas praias, doenças, shoppings, muitos shoppings, algumas pessoas com muito dinheiro no bolso e o povão...bem...continua como sempre...votando no conservadorismo brilhante. Afinal, tudo pode estar uma merda, mas somos a capital do Estado, com cara de Capital, até que enfim!!!!!
Este é o retrato que vejo de Florianópolis no ano de 2080, escrito no calor da hora e da decepção pelas eleições de 2012. Ainda bem que em 2080 já não estarei neste mundo.