domingo, 29 de março de 2009

A entrega

Entregar algo escrito a alguém é uma exposição enorme. Quando escrevo aqui, estou me mostrando a qualquer pessoa que me queira ler. E não sei qual será sua aceitação, sua leitura, sua reação, e claro que sempre dá um pouco de medo. Foi o que senti quando entreguei a dissertação. A defesa será em abril, mas o alívio veio na entrega do trabalho. Inacabado ainda, sem as observações da banca. Inacabado, ainda, porque estou viva e quero sempre fazer algo diferente, e aquilo já não me basta. Plantei árvores, tive filhos, escrevi um livro e alguns artigos. Isso faz de mim alguém mais completo, mais feliz? Por incrível que pareça, a resposta é: sim. Isso me faz mais completa, mais feliz. Esse maço de folhas não é um monte de palavras, mas muitas horas de leituras, muita decepção e alegria, compreensão e incompreensão, muitas horas de andanças para cima e para baixo, muitos livros comprados, emprestados, ideias discutidas. Esse maço de folhas lê a vida de outra pessoa, de como essa pessoa fala de sua vida. Assim eu aqui, Cassandra Rios está ali.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Os meus e os seus

Há vários dias não escrevo, primeiro, porque retomei meu ritmo alucinante de aulas, e depois porque o resto do tempo tenho estado ocupada com minha dissertação e com a vinda de minha namorada e os filhotes para cá. De certa forma, as coisas andam bem, mas bastante cansativas, pois estou em atividade durante longas horas por dia. Junte-se à toda a movimentação um calor digno mesmo de um belo verão, e aí a coisa pega prá valer. Mas não entrei para falar do calor de Florianópolis no mês de março (que costuma ser muuuuuito forte), mas sim da minha sensação ao administrar vida profissional e familiar. Para quem não sabe, tenho três filhos (homens adultos) e agora tenho mais quatro enteados (ai, que palavra estranha...mas é a única que representa os filhos de nossos companheiros ou companheiras), todos homens também, um adolescente e três crianças. Juntando as famílias, somos duas mulheres com sete filhos homens. Vocês podem me perguntar como me sinto. Me sinto ótima. Me dou bem com todos eles, gosto das crianças e estamos começando a nos compreender, aprender uns com os outros. Eles ainda não mudaram para cá, mas vão mudar, e é tudo o que quero. Quero ver como nos sentimos no dia a dia, como é que nossas vidas e relações vão fluir a partir da convivência diária. Aposto positivamente. Claro que não me sinto mãe das crianças, sou a companheira da mãe delas. Estamos, juntas, aprendendo a conciliar nossa relação dentro do pouco espaço que sobra num lar cheio de crianças pequenas. Eles tem pai, mãe, primos, primas, avós, trazem para mim uma outra vida e uma outra leva de pessoas que até então não fazia parte de minha vida. e eu também levo para eles tudo o que minha vida representa e tem. Quando chego à noite e escuto a voz deles dizendo que a Bel chegou, é uma alegria, é como se estivesse revivendo a infância de meus meninos. E vejo a casa me esperando, me recepcionando com amor, com vontade. Sei que parece que estou girando em torno de meu umbigo, mas não se trata disso. Quando aproveito este espaço para contar um pouco de nossas vidas, confronto os valores heteronormativos, mostrando que temos famílias diferentes daquelas que a heteronormatividade tem imposto desde antes de sua invenção como nome e conceito (ver Jonathan Katz). Estou feliz com nossas vidas. Não dá para adivinhar o futuro.